domingo, 27 de julho de 2014

Sobre ignorar seus conceitos


Quando estava no Peru, conheci um casal da Califórnia. Eles estavam na mesma van que a gente, voltando de Machu Picchu. Estávamos todos no último banco da van, aquele em que cabem quatro pessoas. Não falamos nada com eles, e a viagem estava indo bem...

Mas aí eles começaram a comer banana e a jogar a casca naquele espaço atrás do banco, um pseudo porta malas. Olhei pro Thiago e pensei "não acredito que eles tão fazendo isso". A gente já tinha visto muito gringo nessa viagem fazendo coisas que, normalmente, não fariam se estivessem no país deles, mas já que era Latin America, abriam uma delicada excessão. Por isso a chatiação. Bom, passou mais um tempo, o cara me pediu:

"Puedes abrir la ventana por favorrrrr?", com um baita sotaque, daqueles que não deixam dúvida quanto a nacionalidade da pessoa. Abri a ventana.
Fizemos uma parada no meio da estrada para comer e, enquanto isso, o motorista foi tirar algumas coisas do porta malas.. dentre as quais, as cascas de banana.
Voltamos para o carro. O gringo, depois de um tempo, viu que o Thiago segurava um livro em inglês e falou: 

"ah, sabes hablar ingles?"
"yes"

daqui para frente a conversa continuou em inglês:

"ah, pensei que vocês só falassem espanhol"
"não, na verdade a gente nem fala espanhol"
"ah... tá... desculpa"

Depois de uns segundos nessa situação desconfortável, o Thiago disse que éramos brasileiros e que, portanto, falávamos português. Conversa vai, conversa vem.. se passaram mais umas 5 horas de viagem, e não é que os dois eram super legais?

Combinamos de sair com eles na noite seguinte, em Cusco, para jogar bilhar e beber. Eles disseram que no hostel deles tinha um espaço legal e que era tranquilo levar gente lá, então deixamos certo. No dia seguinte, ainda nos recepcionaram com cuba libre e várias histórias super legais.

Nos contaram a história de cada um e de como o cara tinha ido para uma clínica de reabilitação quando os pais dele descobriram que ele fumava maconha, com uns 18 anos (hahaha). A menina disse que era, na realidade, mexicana, mas que foi para os EUA com dois anos de idade. Ele complementava dizendo que, pela nacionalidade da família dela, ele adorava as festas que eles davam - até a vó da menina gostava de encher o caneco (do jeito que deve ser!). Em compensação, a sogra dela só tomava uma cervejinha e já ficava toda alegre (e no dia seguinte negava tudo). Falaram do último presente de aniversário que ele ganhou, um kit para fazer sua própria cerveja, e de como os lotes ficavam muito bons - às vezes. Explicaram que os estados entre a costa oeste e leste dos Estados Unidos têm o apelido carinhoso de fly-over states, because there's nothing there to be seen. Contaram que um dos países em que passariam durante o mochilão de três meses deles, era o Braisl. Rio de Janeiro, São Paulo e carnaval de Salvador. Estava bom. Na realidade, estava ótimo. Combinamos até uma road trip pelos Estados Unidos. Entre toda a conversa, continuaram nos dando cuba libre, de acordo com a preferência de cada um: mais gelo, menos coca, mais rum... 

Subimos, jogamos bilhar, o time das meninas perdeu duas partidas. Coitada dela, que teve que jogar comigo - que adoro jogar, e mais ainda perder no bilhar. Decidimos sair para jantar depois dos jogos porque ninguém tinha comido nada ainda. Fomos descendo aquelas ruas de pedra de Cusco, enquanto o nosso anfitrião ia vomitando pelo caminho, dizendo que não era acostumado a beber tanto e coisa e tal...


sexta-feira, 25 de julho de 2014

Nossa "Obsessão Infinita" pela viagem... dos outros!


Yayoi Kusama Obsessão Infinita arte contemporânea


Acabo de voltar da exposição Obsessão Infinita, da japonesa Yayoi Kusama, que tá rolando até esse domingo em São Paulo. 

Eu conhecia um pouco da história dela, mas confesso que eu mesma estava mais empolgada para ver bolinhas e tirar umas fotos engraçadas, do que para pensar na coisa toda acontecendo ali. Mas uma das coisas que eu gosto de museus e exposições é que na maioria das vezes eles me surpreendem e a viagem pela história que tá acontecendo ali é inevitável. 

Acontece que a Yayoi desde muito nova começou a ter alucinações e a ver repetidamente bolinhas e bolinhas e bolinhas. Isso fazia parte da sua vida - de um jeito bem louco, e lá na década de 1940. Não demorou muito, ela saiu da cidadezinha em que morava, Matsumoto, e foi para nova York. Na Big Apple, ficou amiga de um pessoalzinho tipo Andy Warhol, sabe? Nessa época, ela já era artista e não demorou muito para cair nas graças da audiência e dos críticos. 

E as obras delas eram principalmente sobre as tais das suas alucinações, o que resultava em bolinhas, bolinhas e bolinhas e muita repetição. Hoje ainda há quem diga que tudo não passam de ilustrações engraçadinhas, que não fazem sentido nenhum, e que bolinhas sempre serão bolinhas e pronto! Mas, oi? A mulher conseguiu fazer uma coisa que, a princípio, é um grande desafio para todos: transmitir aquilo que ela sente e vê de uma forma clara e conseguir exprimir essas aflições. As vezes não conseguimos explicar uma coisa nem com palavras, imagina então criar uma obra de arte?

Além disso, ela faz, de fato, o público se sentir no lugar dela (com as devidas proporções, é claro), mas, acima de tudo, tornou o "problema" de saúde dela, vejam só, no motivo do seu sucesso no mundo inteiro! 

Mas isso não é um post sobre arte contemporânea. É sobre a arte de viajar contornando adversidades! Haha! E quem viaja sabe: elas surgem o tempo todo! A menos, claro, que você esteja viajando para ficar em um resort, 100% confortável e com cinco funcionários por quarto, em algum ponto da sua viagem, elas vão aparecer. 

Quando a gente vê fotos de paisagens lindas no instagram, alguém curtindo super um lugar, nunca imagina o perrengue que foi chegar ali, a noite que a pessoa deve ter passado dormindo no aeroporto, ou mesmo a comida muitas vezes duvidosa que encontrou pelo caminho, por isso a viagem dos outros sempre parece perfeita, sem stress nenhum.

Viajar é sim cansativo. Programar a viagem? Também. E se fosse tão fácil não haveria tanta agência de viagens ou gente sem viajar porque tem preguiça. Mas eu garanto que sempre vale muito a pena! Não importam as adversidades que já me surgiram pelos roteiros, nunca me arrependi de viagem que fiz, avião que entrei ou trem em que embarquei. Aprendi a conviver com os probleminhas porque, no fundo, eles sempre dão origem a alguma coisa. No mínimo, se tornam ótimas histórias, não tenha dúvidas!

As adversidades fazem parte da história da viagem e é impossível desvencilhar uma coisa da outra, sabe? Por isso acho que temos que ter uma Obsessão Infinita pela nossa própria viagem, sempre! Qual sua próxima parada?! 

Bom, sabe quem mais tá sussa com suas próprias adversidades? Yayoi, que desde 1973 tá morando numa instituição psiquiátrica porque sabe que domina melhor sua cabeça desse jeito. O lugar fica a poucos passos do ateliê onde ela cria todas as obras que o pessoal tem formado filas quilométricas por semanas para ver!

Yayoi Kusama Obsessão Infinita

Yayoi Kusama Obsessão Infinita

Yayoi Kusama Obsessão Infinita

Yayoi Kusama Obsessão Infinita

Boa viagem a todos! :))))

quarta-feira, 23 de julho de 2014

O bar e o casamento: Veja Campinas Comer & Beber 2014/2015

Em todo casamento o noivo fica esperando no altar. Ninguém sabe o que se passa na cabeça dele no momento em que ele escuta as primeiras notas da Marcha Nupcial e, meio segundo depois, vê a noiva entrando pela igreja a lentos passos, amparada pelo pai. Mas eu acho que eu sei o que esses noivos sentem... 

Bem, pelo menos é assim que eu me sinto toda vez que vejo meu prato chegando à mesa. A música é o ruído que todo bom boteco tem de gente falando, discutindo, e aquele balbucio dos que se lamentam, já bêbados; o garçom, como não poderia deixar de ser, é o anfitrião querido que, com muita cautela, traz aquele que em poucos momentos já será um prato descoberto, totalmente explorado. Apesar dos nossos sentidos captarem o que se passa ao redor, é óbvio que todas as atenções estão voltadas para essa que é a estrela da noite, a receita que, borbulhante e encantadoramente cheirosa chega à mesa. Não há discussões. Nessa hora, até o mais descrente dos comensais reza uma ave maria com o fervor de um papa num domingo na praça São Pedro, e agradece por ter sido convidado para aquele festim (o bar e o casamento). 

O que eu sinto quando vejo aquela cervejinha gelada na mesa é quase a mesma coisa! Acho que foi por isso que o pessoal da Veja Campinas me convidou para fazer parte do júri da Veja Campinas Comer & Beber 2014/2015 na categoria Bares!

Esses foram meus escolhidos:

Veja Campinas Comer & Beber 2014/2015






City Bar
Votei no City na categoria "Para paquerar". Sinceramente, nunca "paquerei" num boteco. Acho até meio estranho ligar uma coisa à outra.. gosto de ir para ficar com a galera, já que "tem sempre aquele que toma mais uma no bar, tem sempre um outro que vai direitinho pro lar" e é isso que eu gosto de ver. Mas, de todos os botecos que eu frequento, acho que o que mais dá espaço para a paquera é o City Bar, pelo pessoal ficar de pé e ser sempre bastante cheio. Ahh, as sextas-feiras... Até Xico Sá já falou de lá com saudosismo!

Veja Campinas Comer & Beber 2014/2015Veja Campinas Comer & Beber 2014/2015


Flor do Minho 
Tradicionalíssimo, rola um samba lá de sexta e sábado que é demais. Do tipo que não é tão comum de achar em Campinas. Eu gosto muito da Casa São Jorge também, mas ultimamente essa coisa de ficar irritada com o volume do som tem começado a aparecer e aí acabei mudando um pouco de ares... (quem ganhou na categoria Música ao vivo foi a Casa São Jorge).

Casa São Jorge 
Falando nela... Geralmente bebo mesmo é cerveja, mas vez ou outra me dá vontade de tomar caipirinha! E sempre quando tô em um lugar e quero tomar uma caipirinha, lembro da que fazem na Casa São Jorge e desejo que o som lá fosse mais baixo para que eu pudesse voltar a tomar elas! ahahha (quem ganhou na categoria carta de drinques foi o Grainne's)

Andanças Gourmet Bar 
Fui a única a votar nele (quen quen quen...) mas tenho boas razões. Já fui nos outros dois que também receberam votos nessa categoria e até gosto, mas eu me identifico mais com o Andanças. O preço é melhor - principalmente para essa recém graduada que vos escreve -, o ambiente é bastante descontraído e é lá que a maioria dos meus amigos gostava de ir na época em que eu mais o frequentava. E comer e beber tem dessas coisas: é sempre subjetivo. Quem nunca se pegou com vontade de comer um prato, por causa da lembrança que ele trazia? (e aqui nem digo da lembrança do gosto, mas aquela memória afetiva que a comida sempre nos traz...). O preço até pode ser uma boa justificativa, mas não é a mais forte, eu sei. Mas nessas horas de escolher onde comer e beber, no fundo, sempre acho que o que vale é a companhia. Então, por mais que eu queira conhecer vários lugares (o que eu eventualmente acabo fazendo), prefiro aproveitar uma sexta-feira para ir naquele bar onde eu sei que todo mundo vai tá reunido. E é isso que o Andanças significa para mim: estar com os amigos. (quem ganhou na categoria cata de cervejas foi o Nosso Bar - super merecido também!)

Rei do Joelho 
Se para mim o Andanças significa estar com os amigos, o Rei do Joelho significa estar com a comida que eu mais gosto e a cerveja mais gelada da cidade! Fácil assim. Por isso votei nele na categoria Cozinha e Boteco. A repetição foi digna. Quem me conhece sabe o quanto eu gosto de carne de porco e de joeho, em especial. Esse prato disputa com a feijoada o pódio do meu coração e estômago. Por isso, quando penso num bar, nem tem muito o que "pensar", ahah. Meu primeiro impulso sempre é querer ir para o Rei do Joelho, mas minha "sorte" é que ele fecha relativamente cedo, o que sempre me dá tempo livre para ir para outros bares. Além de pela comida, uma razão muito forte de me fazer gostar tanto de lá é que o lugar passa um sentimento de "tô na praia". Óbvio que falta o mar, mas eu me sinto tão a vontade que é quase aquela coisa de tá com o pé na areia, sabe? Bom, o pessoal de lá tá super de parabéns pelo prêmio! Fiquei muito feliz quando soube que eles tinham ganhado como melhor boteco!  :)))) O pessoal do Cumbuca também votou neles (e já que sigo eles também faz um tempão), fiquei ainda mais contente com o resultado!

Veja Campinas Comer & Beber 2014/2015
Quem me conhece sabe, Rei do Joelho, rei da minha vida! hahaha 









E aí, em quem vocês votariam para cada categoria??? Gostaram dos resultados? 


Em tempo: valeu pessoal da Veja! Adorei participar :DDD

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Samba na Pedra do Sal, no Rio de Janeiro

Já tinha ouvido falar, mas nunca tinha ido lá para ver: a Pedra do Sal, no Rio de Janeiro. Eu achava que a Lapa era demais (ainda acho), mas agora quando eu for pra Cidade Maravilhosa, ela terá concorrência pelo menos até a meia noite - mais ou menos a hora em que as coisas acabam lá pela Pedra do Sal! 

Cheguei lá numa sexta-feira, umas 22h... Imagina uma encruzilhada lotaaada de gente, um grupo tocando aqueles sambões que até quem não curte samba, se rende?? Então! Foi bem no meio da Copa do Mundo, então tava lotado de turistas, mas também de muita gente que é do Rio - e que na verdade, era a grande maioria lá! 



Falando nisso, é muito comum que quem esteja viajando sempre queira conhecer coisas que quem mora na cidade faz. E a Pedra do Sal é um dos lugares que é TÃO brasileiro, que as vezes nem nos damos conta. Acontece que o samba que acontece hoje lá, vem acontecendo desde quando esse pedaço do RJ era conhecido como Pequena África, onde os escravos se concentravam. Na verdade, se trata de um período que mudaria a história do Brasil todo. 

Nessa região, que fica próxima ao porto da cidade, é o lugar onde os escravos libertos foram morar. Mas não foi ao acaso: ali estavam concentrados vários terreiros de umbanda e candomblé, religiões intimamente ligadas aos antepassados africanos desses ex-escravos. Escravos que vieram da Bahia para o Rio logo após o fim da escravidão também se alojaram por ali. Ou seja, o círculo social de todos os negros acontecia nessa região e, de batuque em batuque, tocando muito pandeiro, violão, cavaquinho e mão, esses negros é que deram origem ao samba urbano carioca, precursor do que conhecemos hoje. Não é a toa que Vinicius de Moraes se derretia tanto pela história desse povo! 

O RJ passou por uma grande transformação no início do século 20, devido a muitas doenças que se proliferaram. A revitalização foi bem prática: destruir uma área de aproximadamente 100 mil m², entre a rua Senador Eusébio, a rua Visconde de Itaúna e o canal do Mangue para dar origem a que conhecemos hoje por Avenida Atlântica. 

Hoje, esse espaço da Pedra do Sal é Patrimônio Histórico e Religioso do Rio de Janeiro e tem uma importância imensa! Imagina só: você tá dançando e ouvindo samba em um lugar que conta uma história que foi apagada de outros pontos da cidade… sem contar que é bom demais!!! Além disso, esse foi o bairro que criou a ideia que temos hoje de favela (vale a ida na exposição do Valongo a Favela: Imaginário e Periferia, que tá rolando agora no Museu de Arte do Rio).

Ah, mas e o nome? bom, o nome vem porque antes aquilo era bem próximo do mar, ou melhor, o mar é que estava próximo dele. E dali eles embarcavam…. sal! 

Para quem quiser saber quando vai ter o que por lá, é só acompanhar pelo face do pessoal PEDRA DO SAL. BTW, parabéns cariocas por terem espaços assim! (aqui em SP a única coisa que eu já vi parecida foi a Vila Madalena durante a Copa... e já acabou).

Se alguém tiver interesse em saber mais sobre essa época do Rio de Janeiro, indico os livros A Busca da África no Candomblé, da Stefania Capone, e As Religiões no Rio, do João do Rio. Sim, tem muito outros, mas esses foram os que eu li ahhaha!

Beijos!!
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